OS ENGANOS DA PSICOLOGIA E DA RELIGIÃO
Desde a figura mitológica de Psyché, aquela bela jovem por quem se
enamorou Eros, até a criação da Psicologia, da Psicanálise e outras
psicoterapias, muito tempo se passou. O que nunca passou mesmo, apesar de
tantos anos e tantos estudos despendidos, foi a falta de compreensão dessas
ciências e terapias, que insistem em “rebaixar” a alma ao condicionamento
existencial, sujeitando-a a todo tipo de mazela, sofrimento, dor e vicissitude
que o mundo material pode oferecer.
Não é de hoje que a Psicologia chama a angústia, a depressão e o tédio,
entre outras enfermidades psíquicas, de “males da alma”. E, nesse viés,
profissionais de diferentes áreas da Medicina, sobretudo da área clínica,
insistem em propalar essa “ignorância” em seus tratados, discursos, palestras e
artigos.
Talvez a culpa não seja totalmente deles nem da própria Psicologia. A
Religião, mormente a cristã, dominadora da cultura e das linhas de conhecimento
do Ocidente, que deveria saber alguma coisa sobre a alma, insiste em tratá-la,
também, como um joguete do mundo e de Deus.
A intenção dessa série de artigos que escreverei aqui não é fazer
frente à Psicologia ou ao Cristianismo, como um todo, mas resgatar a concepção
original e verdadeira da alma e, consequentemente, retirá-la da condição
vilipendiosa, falsa, imprópria, impossível e vulgar em que foi atirada. Essa
tarefa não será fácil e, por isso, sei que apenas poucos leitores compreenderão
o que direi. Destarte, tratarei dessa “defesa” em capítulos, tentando apresentar
bem meus argumentos e esclarecer essa questão, sem deixar dúvidas, não sobre a
alma (que é um tema muito complexo), mas sobre o ponto de vista da minha
Terapia.
Para tanto, levantarei pontos pertinentes à questão de cunho
psicológico, religioso e filosófico, declarações de profissionais dessas áreas,
recorrendo, ainda, a textos que tratam da alma tal como ela é e ao próprio
sentido primitivo, que, ao que parece, há muito foi esquecido. Claro que eu
poderia também iniciar esta série de artigos, dizendo simplesmente: “Tudo bem!
Podem continuar a usar o termo “alma” para essa coisa miserável, mesquinha,
pequena, frágil, mortal e incurável que vocês tratam aí. Eu, em nome da Terapia
Hari e de todo o conhecimento adquirido no arcabouço das várias culturas e
civilizações, já me utilizo mesmo do termo “atman”, que nada tem a ver com
“essa coisa” de vocês”. Mas não se trata de uma abordagem técnica, explicativa
ou pedagógica desse termo, no âmbito restrito da Psicologia, da Filosofia ou da
Religião. Trata-se do resgate da verdadeira concepção de alma, para que as
pessoas, em qualquer desses âmbitos, tenham o entendimento claro do que cada um
deles realmente está falando e não sejam ludibriadas com retóricas acadêmicas,
filosóficas ou religiosas.
A psicóloga, Drª. Lílian Graziano, em seu artigo “Psicologia Positiva:
A psicologia da felicidade”¹, nos diz: “Para esses autores [os fundadores da
Psicologia Positiva, entre os quais, Martin Seligman], a Psicologia nasceu
pautada no modelo de doença, e, como tal, desenvolveu seu olhar exclusivamente
em direção ao caráter disfuncional do ser humano”. E diz mais: “Isso significa,
que na prática, a ciência psicológica raramente consegue ir tão além quanto
suas discussões filosóficas poderiam sugerir, quando o assunto é a compreensão
da totalidade humana, uma vez que todos os seus esforços têm sido direcionados
a apenas um dos lados da moeda”. E, para concluir suas observações, diz ela:
“Preocupada apenas em curar doenças, a Psicologia deixou sem respostas aqueles
que questionavam sobre ter uma vida feliz, abrindo espaço para que as forças e
as virtudes humanas fossem discutidas sem base científica e, por vezes, de
maneira hipersimplificada”.
Evidentemente, as palavras da drª. Graziano não pretendem detratar a
Psicologia, e muito menos respaldar minha defesa na temática deste artigo, e,
sim, valorizar o trabalho da Psicologia Positiva, da qual é membro, como um
avanço da ciência psicológica. No entanto, seu discurso serve como aviso às
limitações da Psicologia tradicional e seus possíveis enganos e falhas. Um
desses, sem dúvida alguma, se dá quando essa ciência impinge à alma os males que
são de natureza psicofísicas, ou seja, males existenciais (esfera a que a alma
jamais pertenceu, e jamais pertencerá).
Considerando que a Ciência e a Religião são dois baluartes da cultura
ocidental e, se estou com a razão, ambas são incapazes de fornecer uma
concepção verdadeira de “alma”, indo além, em seus respectivos enganos, ao
deturpar o próprio conceito e definição de “alma”, vilipendiando-a com suas
respectivas acusações a ela – no caso da Ciência, afirmando que a alma está
sujeita a enfermidades; no caso da Religião, pregando que ela pode ser queimada
e destruída; parece-me louvável exortar os meus leitores a seguirem o mesmo
conselho que o filósofo Sêneca ( ) deu
a seus contemporâneos: “Recusem-se a seguir a multidão!”, que neste caso seria:
“Descreiam dessas afirmações da Psicologia e do Cristianismo sobre a alma!”, e
me ouçam.
A Ciência e a Religião se apropriaram do termo “alma” e, de certa forma,
manipularam sua definição ao bel prazer, em favor, evidentemente, dos seus
interesses próprios. Para a Psicologia, por exemplo, era necessário trazer a
alma para o âmbito físico, para que seus estudos pudessem ser aceitos como
“científicos”, e ela se desvencilhasse da Filosofia, sem descambar para uma
espécie de “psicometafísica”. Para o cristianismo, a alma não poderia manter
sua condição de eterna, pois seria da mesma natureza de Deus, e não haveria
como “assombrar” os cristãos com suas visões do Inferno (lugar destinado às
almas dos pecadores, segundo a Igreja). A alma que é “alma” mesmo, no entanto,
não é manipulável em seus verdadeiros atributos – ela não sofre as aflições
físicas nem pode ser queimada no fogo, nem mesmo o do Inferno – nem mesmo pela
“vontade de Deus”.
Em meu livro, “O Governante das Estrelas – Da Materialidade do Eterno”
(ainda não publicado), explico que o Paramatman (a Alma Suprema) é constituída
por partes e parcelas denominadas de “atmans”, as quais são indissociáveis dEle
e possuem a mesma “essência” e “atributos”. Isso significa que, se os atmans
estivessem sujeitos a mazelas, à ação do fogo e à morte, o Paramatman (Alma
Suprema/Ser Supremo, ou “Deus”, se preferirem) também estaria, pois são todos
da mesma “natureza”. Lá, também explico que até o Paramatman tem o seu duplo ou
dublê. Este é denominado de Hari, o “Jiva Supremo” (Alma Suprema encarnada),
cujo corpo é toda a extensão do Universo, constituído de duas Naturezas: a
material e a espiritual. São essas “Naturezas” que criam e mantém todos os
seres do Universo (isso quer dizer em todos os planetas de todas as galáxias e
de todos os recantos imagináveis ou não). No planeta Terra, somente os humanos são “jivas” (alguns só entenderão
se eu disser: “Somente os humanos têm alma”, pois muito bem, que seja). Os
demais seres, plantas, animais e vegetais, recebem da “Natureza” apenas os
veículos necessários à sua “expressão” no mundo/Existência, a saber: um corpo e
um espírito. Isso significa que tais seres não possuem uma “essência” no
mundo/Eternidade, pois eles “não são atmans”, como nós.
Para que minha exposição fique mais clara, é necessário informar ao meu
leitor que, segundo a Terapia Hari, há duas instâncias a serem consideradas,
quando tratamos conjuntamente de Alma, Deus e Seres Humanos, a saber: a
Existência, que constitui tudo o que é físico, material, elementar, sutil,
etéreo, mental, psíquico, fluido, atômico – numa palavra, objeto de estudo e
perscrutação do intelecto; e a Eternidade, instância inacessível à perscrutação
lógica, que é a totalidade de toda a Existência e ainda mais (sendo esse “mais”
o imperscrutável, tal é a sua “essência”) e que é considerado, na T.H., como
Paramatman (Alma Suprema), do qual fazem parte todos os atmans (almas individuais).
Embora essas explicações ainda não se demonstrem totalmente compreensíveis,
ajudarão na compreensão dos meus argumentos, em breve.
É preciso lembrar que muito antes do surgimento da ciência psicológica
e ainda antes do próprio cristianismo, a alma já era “perscrutada” em suas
possíveis características e atuações. Claro que nunca houve um consenso entre
as variadas culturas e povos primitivos. No entanto, algo fundamental
participava de todas as noções e conceitos sobre a alma, sempre considerando-a
como tendo uma natureza sagrada, divina e transcendental. “Os caracteres
fundamentais das religiões professadas pelos povos primitivos são: crença num
poder supremo; crença em espíritos independentes; crença na alma humana,
distinta do corpo e separando-se do mesmo com a morte”². Para nós da T.H*, a
expressão “alma humana” não passa de um reforço de linguagem, pois toda alma só
pode ser “humana” (até que tenhamos provas consistentes de vida igual ou
superior à nossa, universo afora, que possa comportar também a ideia de
existência, a partir desse “elemento vital”).
Para finalizar a primeira parte dessa série de artigos sobre a alma,
deixarei esse trecho, encontrado no Bhagavad Gita, que diz: “A alma nunca pode
ser cortada em pedaços por nenhuma arma, nem pode ser queimada pelo fogo, nem
umedecida pela água, nem seca pelo vento. Esta alma individual é irrompível e
insolúvel, e não pode nem ser queimada nem seca. É eterna, todo-penetrante,
imutável, imóvel e eternamente a mesma.”
¹ Revista Ciência & Vida Psique, Ed. Especial, Ano III Nº8, Ed. Escala
² História da Educação Universal e Brasileira (Intermedial Editora), autor Nelson Valente