Capítulo
I
A
SEMENTE
- Meu
filho, o que você faz aí, deitado nessa cama? Vá brincar com os seus
coleguinhas!, foi assim que minha mãe me
despertou do meu "sono acordado".
Por
volta dos meus dez anos de idade, era muito comum eu me isolar, para viajar num
mundo só meu, que ninguém mais via. Por lá, eu via coisas que neste mundo aqui
não havia; lá, eu aprendia muito mais do que por aqui. Foi num momento assim
que minha mãe me apanhou deitado em sua cama, geralmente com as pernas pendendo
para fora dela. Era meu jeito de “sonhar” ali. Minha mãe não conseguia entender
aquilo: como é que eu não estava brincando, como os outros garotos da minha
idade? Eu também não sabia por quê.
Anos
mais tarde, descobri que provavelmente havia muitas outras crianças que
“perdiam o olhar dentro do nada”, como se buscassem um mundo onde todas as
respostas podiam ser encontradas. Como pude ver nesse depoimento de Fred Alan
Wolf (físico americano especializado em Física Quântica), no livro “Quem somos
nós?”:
“A
pergunta realmente é: o que Deus está fazendo para construir um universo? [...]
Meu interesse sempre foi pela magia como uma forma de abordar o que eu pensava
ser uma coisa muito miraculosa. Basicamente, por que estamos aqui? O que está
acontecendo? Mesmo quando criança eu fazia essas perguntas.”
Eu
era muito taciturno em casa, mas na escola, eu era muito divertido. Gostava de
estudar, gostava do ambiente escolar, dos colegas, dos professores. Fui assim
por um bom tempo, até que algo aconteceu.
Naquele
dia, o primeiro horário era de matemática, com o professor Mesquita. Eu, como
sempre, sentado em uma das carteiras da frente da sala, para não perder nada da
aula. Mas já se haviam passado quase 30 minutos e eu não dera “um pio”, nenhuma
palavra, nenhum gracejo. O professor Mesquita estranhou.
-
O que é que está havendo? Você está tão quieto, não falou nada até agora!,
observou o professor.
-
Nada, não! – respondi evasivo, mas ele insistiu:
-
Nada, não, você não é assim. O que foi que aconteceu?
-
Minha mãe morreu!, disparei apenas sério, sem esboçar qualquer expressão de dor
ou tristeza.
A
turma toda entrou em comoção, embora alguns ainda esperassem que tudo não
passasse apenas de mais uma das minhas brincadeiras. O professor quebrou o
silêncio e perguntou com ar de aborrecimento.
-
Você está brincando? Não brinque com essas coisas!, sentenciou.
-
Não estou brincando, Ela morreu mesmo!
Isso
foi suficiente para a aula terminar. O professor Mesquita foi até a diretoria
comunicar o fato. A diretora veio de lá, não para me dar os pêsames ou coisa assim
– ela veio para me dar um “carão”.
-
Como é que sua mãe falece e você não comunica a escola e ainda vem para a sala
de aula?, detonou.
-
Eu não sabia que tinha que comunicar. Desculpe!, falei com sinceridade.
-
Vá para sua casa imediatamente!, disse a diretora para mim, e voltando-se para
a turma, concluiu: Não haverá mais aulas hoje, podem ir para casa. A mãe do
colega de vocês faleceu!
Eu
voltei para casa, onde todos estavam tristes pela morte de mamãe. Eu também
estava, mas, estranhamente, eu não aparentava nada; fiquei apenas sentado no
muro lá de fora. Até que um amigo, vizinho nosso, se aproximou para dar os
pêsames. Então, me vieram as primeiras lágrimas, e quase não pararam mais.
Naquela
época, eu tinha apenas 17 anos e o mundo ficou grande e vazio demais. Achei que
aquele dia jamais ia acabar. Identifiquei eternidade e tristeza como sendo a
mesma coisa – um sem-fim de tudo, de tudo o que não fazia mais sentido. Mas
isso só durou algum tempo. A vida sempre acha um jeito de nos cativar outra vez.
E ela também achou comigo.
No
entanto, nada mais foi como era antes. Eu já não estava mais disposto a apenas
aceitar o que me diziam, não importava qual fosse a autoridade. Eu não aceitava
mais as respostas prontas, as explicações que nada explicavam. Eu, dali em
diante, faria as minhas próprias perguntas e iria atrás das respostas que
realmente me convencessem, que fossem plausíveis e não mero jogo de palavras.
Acho que a semente de tudo isso – de tudo que relatar aqui – brotou naquele
momento, em minha vida. Dali em diante, eu criaria a minha própria “filosofia” – eu
desenvolvi a minha “terapia do viver”.
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