segunda-feira, 2 de fevereiro de 2015

A TH E O NOVO PARADIGMA

EM BUSCA DE UM NOVO PARADIGMA



A moral e as religiões, que não passam de acordos e/ou tratados comportamentais e ritualísticos impostos a cada sociedade que os admite, são considerados até hoje como os fomentadores e mantenedores da civilidade entre os homens, mas não há como negar que ambas falharam em seu propósito, pois o que estamos assistindo até os dias de hoje é uma selvagem luta de homens contra homens, pelos motivos mais banais ou por questões ideológicas, econômicas, socioculturais e até religiosas. O mundo que temos de encarar todos os dias é um mundo perigoso e violento, repleto de rivalidades de toda espécie, do qual somos uma vítima em potencial, sejamos culpados ou inocentes.

Ao que parece, devemos lançar mão de uma nova proposta, um novo paradigma, que pode até lembrar os princípios morais e religiosos, mas que, na verdade, precisam ser fundamentados em novos valores e novas noções. De nada adiantará um esforço por qualquer mudança para melhor, se não nos livrarmos de certos valores e ideais que não valorizam o homem – só o escravizam mais. A moral que pretenda se impor como uma lei sobre o homem deve antes de tudo saber “o que é o homem”; deve promover a sua realização; deve primar por seus instintos nobres. Uma religião que pretenda indicar um caminho espiritual para o homem deve, sobretudo, conhecer a sua dimensão espiritual; jamais poderá impor a ele “leis divinas”, pois qualquer suposto “Deus” nunca poderá ser conhecido ou reconhecido de cima para baixo. Já não importa mais aquilo que impôs como tradição; já não importam as palavras encontradas na “letra morta” das Escrituras Sagradas; já não importa a autoridade do sacerdotes ou das Instituições Religiosas – tudo isso falhou, e tornou-se urgente uma mudança radical de nossa visão sobre tais coisas. Não sou eu quem diz “falhou”. Basta uma breve observação das coisas à nossa volta, no nosso dia-a-dia, nas nossas relações, na família, no trabalho etc. Tudo está em ruínas por toda parte, e nós não podemos apenas apontar os possíveis culpados (que certamente somos nós mesmos), temos que buscar um novo caminho, pois esse não nos levou a nada de positivo – ele está arrasando dia após dia com nossas vidas, nossas relações, nossa potência.

Estamos demasiadamente acostumados a este corpo que temos para renunciar um pouco a ele. Isso não significa “negligenciá-lo”! Precisamos relembrar que ele é apenas um veículo. Veículo de quem? Daquele que realmente somos, ora! E quem somos? Bem, essa descoberta não pode ser feita apenas verbalmente, apenas intelectualmente, apenas pelo peso de alguma autoridade, que nos dirá “nós somos isto ou aquilo”. Todos concordamos que há em nós uma busca pela felicidade, pela Verdade, pela auto-realização. Também devemos concordar que há no homem uma dimensão espiritual, ou seja, algo intrínseco que o impulsiona a reconhecer que há valores maiores do que todos os bens materiais que se possa conquistar, e que também lhe dá uma certeza ou, pelo menos, um forte impressão de que ele é algo mais sutil, porém, mais duradouro e maior do que o corpo.  Infelizmente, só percebemos isso, com maior freqüência, nas situações tristes ou adversas, como diante da morte de alguém que amamos. Sua ausência se faz uma presença. Quando é alguém que nos conferia proteção e afeto, como mãe ou pai, passamos o resto de nossas vidas com uma leve impressão de que ela ou ele nos “vigia” e “cuida” de algum lugar invisível. De onde nos vem tal impressão? Seria ela apenas um expressão do nosso medo, da nossa angústia, da nossa fragilidade, da nossa condição de mortais?

O que acontece ao homem, na morte, para que ele se torne apenas aquele corpo inerte, rijo, isento de qualquer sensação ou vontade? O que havia nele, enquanto vivo, que fazia circular o seu sangue, que mexia seus músculos, que o fazia pensar, falar e agir com decisão e vontade? Ora, deve haver algo que dá vigor ao corpo e o ponha em funcionamento mesmo ao dormir ou em estado de coma, e esse “algo”, ao se retirar dele, o deixa inerte e sem vigor. É esse elemento, essa entidade, essa força motriz que deve ser procurada. Talvez, alguns de vocês pensem: “Ora, mas isso já sabemos há muito tempo o que é – trata-se da nossa alma!”. Ao que eu perguntarei: “Mas quem descobriu isso? Fomos nós mesmos, ou foi outro alguém que nos levou a aceitar essa suposta descoberta dele? Fica claro agora que ninguém pode descobrir as coisas por nós – principalmente se essa “coisa” diz respeito a nós. Ninguém pode chegar em nossa casa e dizer: “Olha bem: isto é teu corpo e aquilo é tua alma!”. Seja lá quem for, essa pessoa não tem tal autoridade e sua proposição é no mínimo suspeita. Portanto, devemos abandonar todo o tipo de autoridade, seja moral ou religiosa, se somos sérios no toicante a fazer nossa própria descoberta e assim encontrar um novo paradigma para nossas vidas. Sim, porque, antes de fazer essa grande descoberta (quem somos nós), continuaremos uma multidão de selvagens supostamente civilizados, que se devoram mutuamente, dia após dia.

O mundo atual é um verdadeiro caos, um lamaçal de intrigas, de rivalidades, de competições insanas. A moral jamais poderá dar cabo disso e as religiões só têm colaborado com mais intolerância e conflito. Não saber quem somos redunda em não saber como lidar com essa nossa selvageria e assim, se não destruirmos em breve toda a humanidade, perpetuaremos nossa guerra desumana ad infinitum.

Neste ponto, alguns de vocês podem dizer: “Que tipo de proposta o senhor tem a nos oferecer? Pois, se já não podemos mais seguir desta maneira, precisamos de uma outra que a substitua!”. E eu direi: “Se eu der a vocês o novo paradigma, estaremos incorrendo no mesmo antigo erro!” Notem que foi assim que se estabeleceram a moral e a religião, e isso não queremos mais. Portanto, precisamos trilhar esse caminho, essa busca, juntos – sem que qualquer de nós se imponha como autoridade. É claro que podemos perceber algumas pistas que devem levar ao que procuramos, mas devemos seguir lado a lado. É fácil ir numa certa direção, com a sensação de segurança, quando há um guia, um líder; é fácil não ter a responsabilidade de se perder, de se desguiar; enfim, é fácil ser “rebanho”. Mas isso já foi feito – e não deu certo, nem jamais dará!

Talvez eu já tenha feito algumas descobertas interessantes, as quais me dão certa segurança no meu caminhar. Mas cada um deve estar disposto a fazer suas próprias descobertas, encontrar certas pistas que assegurem que está no caminho certo. A T.H. pode ser muito útil nessa busca. Pode ser útil para todos, porque foi útil para mim. Mas cada um já deve trazer consigo certas noções, que não podem ser aquelas caducas; certos valores, que não podem ser aqueles ultrapassados. Não chamaremos isso de certezas ou convicções – chamaremos de “pistas”. Como chegaremos a elas? Como eu disse lá no início desta dissertação, primeiramente devemos deixar um pouco de lado esse nosso “culto à matéria”, ao corpo, ao veículo das percepções existenciais. È preciso introspecção!

A Meditação T.H. não é muito diferente daquela já tão conhecida de todos que se interessam por assuntos espirituais, yoga e relaxamento. Mas ela tem, sim, sua diferença. Ela tem etapas e não se limita a alguns minutos por dia. Ela tem o seu momento de quietude e o seu momento de ação. Por isso é que a T.H. é uma prática holística para o cotidiano. Mais ou menos como ensinado nas escolas Zen, nossa meditação tem que imiscuir nos afazeres diários. No começo, haverá dificuldades, porém, em breve, será tão simples quanto é para um adolescente “estudar e ouvir música”. A prática trará facilidade; o domínio dela, a experiência.


Também como disse mais em cima, o novo paradigma não pode ser imposto cima para baixo – ele deve ser encontrado aqui, em nós, e jamais provir de uma autoridade externa, não importa qual seja ela. O novo paradigma é um desafio nosso e, quando encontrado, será uma conquista nossa. Ninguém mais nos dirá “somente de mim vem a salvação”; nenhum Avatar, nem o mais excelso deles. Primeiramente porque não estamos em busca de qualquer salvação (isso foi uma noção que nos foi imposta e um valor já ultrapassado); em segundo lugar, porque já sabemos que encontrar a Verdade é muito mais valoroso do que recebê-la das mãos de outrem. 

segunda-feira, 1 de setembro de 2014

A DECADÊNCIA DOS SISTEMAS POLÍTICOS E RELIGIOSOS

CONTRIBUIÇÕES DO PENSAMENTO KRISHNAMURTIANO À TERAPIA HARI

No artigo anterior, falamos do acúmulo do passado na mente e na vida das pessoas e principalmente da questão do medo que não as deixa viver plenamente. Neste, daremos continuidade a essa temática e avançaremos mais no pensamento de Krishnamurti.

A frase “Uma vida que não é revisitada não merece ser vivida!”, creditada a um dos grandes filósofos gregos, Sócrates, é bastante conhecida nos meios acadêmicos, entre estudantes e professores de Filosofia. Da mesma forma, aquelas perguntas básicas, como por exemplo “De onde viemos?”, “Para onde vamos?”, “Qual o significado da vida?”, “Existe Deus?”. Pois bem, Krishnamurti nos diz que tais perguntas são “inanes”, ou seja, não fazem nenhum sentido ou não têm nenhuma importância. Segundo ele, o que importa mesmo é termos uma mente atenta e séria: “Sem dúvida, a mente medrosa, confusa, que se satisfaz com uma mera explicação, é completamente incapaz de exame. Para fazer uma pergunta correta, a pessoa deve estar plenamente amadurecida – não em anos, porém interiormente. Maturidade implica compreensão total da existência, percepção total: escutar, ver compreender o amor, a verdadeira essência de um viver total. Só uma mente amadurecida pode fazer a pergunta correta, e esta pergunta correta não requer uma resposta de fora, porém a resposta estará contida nela própria”.

Unicamente lendo as palavras de Krishnamurti, dificilmente se entenderá do que ele realmente trata, pois o pensador indiano não emprega, por exemplo, as palavras  escutar, ver, viver e compreender, com o mesmo significado ou intenção que geralmente lhes são dados. Ele não diz “ver” ou “escutar”, referindo-se meramente aos sentidos comuns, Krishnamurti fala como se esperasse que os que o ouvem já fossem capazes de ir um pouco além dos meros sentidos. “O ato de escutar – tal como o de ver, é, com efeito, uma das coisas mais difíceis que há. O ver uma coisa muito claramente exige-nos toda a atenção”. Outra coisa: é importante perceber que até a palavra “amor” não tem aquele aspecto romântico ou espiritualista (como soa, quando ouvimos do Cristo, por exemplo, ou de pregadores de templos e igrejas). Tão é assim que ele relaciona “amor” com uma outra palavra com a qual não é comum (e até parece um tanto estranho) se associar. Ele diz que “interesse é amor”, querendo dizer provavelmente que quando “amamos” verdadeiramente damos toda atenção à coisa ou à pessoa amada, dedicamos todo o nosso “interesse” a ela, estamos plenamente “interessados” só por ela – com total “dedicação”.  E ele completa: “Só quando há grande afeição e amor pode-se ver o movimento total da vida”.

Lembremos que Krishnamurti, em suas palestras, pretende deslocar o pensamento de sua audiência para fora do condicionamento causado pelo tempo e seus mecanismos, como a memória, a repetição e a velha significação dada às palavras, principalmente aquelas palavras que imediatamente após serem lidas ou pronunciadas causam uma reação na mente – como se “a palavra” fosse “a coisa”. Quando da sistematização da T.H., também foi necessário “dessignificar” e “reconceituar” certas palavras demasidamente desgastadas pelo uso religioso e sentimentalista, tais como “atman”, “Avatar”, “Eternidade” e “Ser Supremo”. E a temática levantada neste capítulo da série, é bastante pertinente, para que se tenha a noção da proximidade da proposta do pensador indiano com os propósitos da T.H. Sigamos com as palavras do próprio orador: “Sei que uma das coisas atualmente em voga, na religião, é “a busca da verdade ou Deus”. Tendes de lançar ao mar essa palavra sem significação. O que tem significação é descobrir se o cérebro pode tornar-se altamente sensível, quieto e livre”, diz ele. Ora, a “sensibilidade” da qual o orador fala de forma nenhuma pode ser aquela com a qual estamos acostumados a tratar – a sensibilidade ao toque, à dor, ao carinho, absolutamente. A sensibilidade à qual ele se refere é uma tal que deixa todo o nosso ser em atenção, ciente de tudo o que vemos, como se tudo fosse maravilhosamente novo, ou seja, não lhe dando nenhuma já usada significação ou interpretação – apenas dedicando-lhe total “interesse”.

Krishnamurti nos exorta à busca da verdade que não está nos livros sagrados, nem nos templos, nem nas igrejas, e nem mesmo poderia ser monopólio de uma religião ou de um autoridade qualquer, fosse essa autoridade um guru, um Avatar, o papa, Cristo ou Buda. Essa “verdade” só pode ser encontrada “em nós” e de forma nenhuma “lá fora”. Para tanto, ele nos tenta mostra o poder desastroso que o tempo exerceu sobre nós, sobre nossa mente. É por isso que ele diz: “Dez mil anos de propaganda formaram essa consciência. As religiões, os guias, políticos ou religiosos, os livros, a propaganda, as crenças, as doutrinas, os salvadores, perderam toda a significação”. O orador quer que percebamos como a propaganda, enquanto instrumento do tempo, exerceu sobre nós uma tremenda força dominadora que não nos deixa pensar “o novo” – somente o velho, ou que está estagnado e morto para “a vida”. Então, ele completa: “E tudo isso é o resultado da propaganda, propaganda do Gita, da Bíblia, do Alcorão ou das teorias de Marx e de Lenine. Entendeis? Eis o que somos, sem nada de original, nada de verdadeiro: entes humanos de segunda mão”.

  

 Causar uma total “desilusão” sobre todos os sistemas, políticos ou religiosos, seguidos até aqui, como se fossem fórmulas ou modelos para uma vida plena, livre dos conflitos, das guerras, é o que Krishnamurti pretende nessas suas palestras. Evidentemente, que o público, e também nós, ficamos sem qualquer chão, se temos que erradicar de dentro de nós todas as nossas crenças, todas as nossas significações; se temos de remexer velhas idéias e, despidos delas, encontrar sozinho a verdade que tanto buscamos. Por isso mesmo ele admite que não é uma tarefa fácil tomar para si total responsabilidade pela busca, sem contar com qualquer velha autoridade, representada pelo que quer que seja, homem, doutrina, regime ou livro sagrado. “O mundo se acha em guerra; e acredita-se que, pelo poder de uma certa prece, uns poucos indivíduos, reunidos e pronunciando determinadas palavras, serão capazes de resolver esta imensa questão que há mais de 5 mil anos permanece sem solução. E continuam a repetir-se tais palavras, embora se saiba que jamais se porá  fim à guerra dessa maneira”, falando assim o pensador nos põe cara a cara com nossas crenças banais e imputa toda a culpa do caos a nós, que deixamos tudo seguir sempre assim, sem qualquer objeção. “Se investigardes bem profundamente, verificareis que o homem é indolente. O caos se originou da preguiça, da indiferença, da inércia do homem, do seu espírito de aceitação. Essa aceitação gera uma tremenda indolência. Não ousais questionar vossa religião, vossa comunidade, vossa crença, a estrutura social, o nacionalismo, a guerra; aceitais tudo”. E conclui: “Dessa maneira vivemos a séculos e séculos, sempre a contar que outro resolva os nossos problemas. Seguir outra pessoa é a essência da indolência”.


O pensador indiano não economiza esforços para nos fazer abdicar dessa nossa agradável “zona de conforto”, que só males nos tem causado, embora, indolentemente, acreditemos que seja a causa de nossa sobrevivência sobra a Terra. Acreditamos que seguindo Krishna, Rama, Shankaracharya, Buda ou Cristo, estamos seguindo o caminho da “verdadeira religião”; acreditamos que seguindo o que disse Marx, Lenine, Churchill, Gandhi, ou outro qualquer, estamos corretamente engajados na mais perfeita política social, favorecedora dos anseios populares e supridora das necessidades dos homens. “Não julgueis que qualquer dos políticos ou dos guias religiosos, por todo o mundo, esteja vendo o problema como um todo. Há fome, há guerra; a religião falhou totalmente e nada mais significa, exceto para umas poucas pessoas. A crença organizada está perdendo sua força, a despeito da espetaculosa propaganda que se faz, nos jornais e em toda parte, em nome de Deus, em nome da paz. Vemos, assim, que nem a educação, nem a religião, nem a política resolveu o problema, e tampouco a ciência o resolveu”.

Se, como diz o pensador, todas as crenças e todos os regimes políticos falharam em resolver o nosso grande problema existencial, que é o conflito, tanto interior quanto exterior, e nem mesmo a educação ou a ciência foram capazes disso, nem promovem qualquer mudança verdadeira, para melhor, isso não quer dizer que devamos viver à deriva, desamparados de toda instrução e descrentes de toda a ciência, mas tão-somente promover uma total mudança em nossa maneira de viver, o que refletirá em todas as atividades humanas, portanto, na nossa maneira de educar e de fazer ciência. Quanto à religião e à política, o caso é mais complexo, uma vez que a primeira se perpetua pelo poder da autoridade sacerdotal, ou da tradição dos ritos, ou ainda da palavra morta dos livros sagrados; e a segunda, promove uma noção de poder dominador sobre aquele que recebe legitimamente ou pela força a tarefa de legislar sobre o povo e manter a ordem (geralmente conforme lhe seja favorável, e não necessariamente conforme os anseios dos súditos ou subordinados).

O fato é que, sem contradito, pode-se perceber claramente que a humanidade tem caminhado com pouco êxito para a paz e a felicidade desejadas. Nosso próprio modo de viver promove a guerra, que, segundo Krishnamurti, é a expressão final do conflito que há dentro em nós. Voltando, então, ao que foi dito por Sócrates, na Antiga Grécia, toda a nossa vida precisa ser revista, no sentido de encontrarmos um novo caminho, que não seja pautado na acumulação do conhecimento, que até aqui só nos fez reforçar “a imitação”, “a cópia” do erro, “a repetição” de fórmulas vazias e ineficazes. E  é com as próprias palavras do orador indiano que encerramos este segundo artigo da série:
“Temos de compreender este enorme problema, ou seja, que está em jogo o destino do homem, a sorte do ente humano e não de algum indivíduo em particular.” 

terça-feira, 26 de agosto de 2014

MENTE: PASSADO E IMITAÇÃO

UMA ABORDAGEM SEGUNDO O PENSAMENTO DE KRISHNAMURTI

“Eu sustento que a verdade é uma terra não trilhada e que não a alcançareis por nenhum caminho, nenhuma religião, nenhuma seita...”.

Essas palavras foram proferidas por Jiddu Krishnamurti, no dia 3 de agosto de 1929, ao dissolver a Ordem da Estrela do Oriente, diante de uma multidão que ficou chocada com tal atitude. Em meio a 2 mil membros da Ordem, estava a sua mentora, a Srª Annie Besant. Dali em diante, Krishnamurti faria sua busca sozinho e falaria não a seguidores, mas a pessoas que estivessem dispostas a ouvir e fazer a mesma busca que ele. Esse fato é relatado em seu livro “Viagem por um mar desconhecido”, uma coletânea de palestras dadas na Índia, mais precisamente em Madrasta, Bombaim e Nova Délhi.


Nessa série de palestras, Krishnamurti trata sobre a acumulação do passado numa mente que não está livre, pois só se limita a copiar e a imitar os velhos padrões, buscando inutilmente assim resolver suas questões do presente, como o medo, a solidão, a frustração, a angústia etc. Ele diz que o ajustamento a um padrão e a obediência a autoridade exterior e interior (esta também, um resultado da memória, portanto imitação); que a busca da verdade através de uma religião, de uma seita, um partido ou um regime político, também conduzem ao já conhecido – que nunca trouxe paz ou liberdade. Com suas palavras: “Nossa vida atual é toda a agonia. Confusão, ansiedade, sentimento de culpa, profunda frustração. E, em vista do tédio, da solidão, do medo existente na vida de cada dia, é óbvio quem devemos descobrir uma maneira, um estado ou uma existência que não seja de mera repetição, como a atual”.

Aqui, tentarei trazer esse pensamento krishnamurtiano para dentro dos ensinamentos e das propostas da T.H., a fim de que tenhamos uma visão bem clara de como esse pensador pode ser trabalhado nos nossos estudos de Filosofia Avançada e, em seguida, aplicado junto aos nossos pacientes. É importante lembrar que a T.H. tem em pensadores como Krishnamurti o baluarte de suas proposições, pois considera que tanto nos filósofos ocidentais quanto nos orientais encontra-se a chave da sabedoria para uma vida plena, posto que foram homens que se debruçaram sobre as questões da Existência e graças a suas meditações podemos aplacar o sofrimento que persiste, diminuindo a escuridão que vem da ignorância e preenchendo o vazio de nossas temeridades. Por isso, começarei aqui tratando sobre o medo.

Ora, quem não dirá que o medo é intrínseco a natureza humana? Especialistas em várias áreas do conhecimento, psicólogos, pedagogos e outros, já se pronunciaram em favor da necessidade do medo como uma espécie de “instinto de sobrevivência” – tanto nos animais quanto nos seres humanos. O medo seria então aquilo que nos daria a medida do perigo, do risco. No entanto, precisamos nos aprofundar nessa questão do medo para que possamos também estabelecer os seus limites e só assim compreender a abordagem que faz Krishnamurti quando trata dele. Como, por exemplo, quando diz: “Desejo que todos os que queiram compreender-me sejam livres, não para me seguirem, não para fazerem de mim uma gaiola que se torne uma religião, uma seita. Deverão antes estar livres de todos os temores – do medo da religião, do medo da salvação, do medo da espiritualidade, do medo do amor, do medo da morte, do medo da própria vida”.


Logo vemos que o pensador indiano não trata do medo que realmente temos que ter de uma cobra venenosa, de uma fera selvagem, ou de cairmos no fundo de um abismo. Ele trata do medo que temos mas que não se justifica. O medo de não termos uma religião. Muitos já advogaram que “sem religião, o homem seria um imoral”, como se a moralidade fosse um dos frutos da “árvore-religião”. Mas sabemos (ou, pelo menos, deveríamos saber) que ambas, moralidade e religião, são frutos da cultura, da tradição, portanto da memória – o que Krishnamurti resumirá com a palavra “imitação”. O ser humano religioso e ignorante provavelmente pensa que “Deus” só tem olhos para aqueles que professam uma religião e que “Ele” abandona os que não têm – e isso é o fator do “medo da religião” de que trata Krishnamurti. Por conseguinte, as religiões advogam o monopólio desse “Deus” para si – cada uma delas se diz “dona de Deus”, e que só nela há retidão, moralidade, adoração e salvação, conforme o exigido por “Deus”. Portanto, como vemos, o medo que está sendo tratado aqui, em Krishnamurti, é um medo que se destrói tão logo a ignorância é vencida – coisa que não poderíamos afirmar do medo de um perigo iminente, como estar de frente para uma fera, por exemplo.

Esse tipo de medo, do qual tratamos aqui, é o que gera a angústia, a depressão, a tristeza. Aquele que nos paralisa e não nos deixa livres para viver. Então, tememos a própria vida; tememos também a morte, e cada passo dado na Existência é acompanhado de um tormento, de um sofrimento. Toda essa tortura existencial mantém um conflito interior, em nós, mas esse “conflito interior” pode e deve ser debelado. Porém, como o próprio Krishnamurti diz, isso não será possível usando as mesmas velhas fórmulas que até aqui falharam, e que apenas se renovam como cópias, imitações criadas por uma mente embotada, repetitiva e temerosa. Ele diz: “Os entes humanos não podem continuar a viver como têm vivido, a matar-se e odiar-se reciprocamente, a dividir-se em nações, em atividades triviais, estreitas, individualistas, porque por esse caminho o que se encontra é mais aflição, mais confusão e mais sofrimento. [...] É a imagem egocêntrica que se identifica com a família, com a nação, com conclusões ideológicas, com partidos – políticos e religiosos. É esse centro que, dizendo-se em busca de Deus, da Verdade, impede a compreensão do todo da vida”.

Krishnamurti nos alerta que não devemos perguntar a ninguém se somos feios ou belos, pois somente nós podemos saber isso, basta prestar atenção no que realmente somos. Ele diz que há uma grande responsabilidade nesse “prestar atenção”, e acrescenta: “Não desejamos prestar atenção, porque temos medo do que possa acontecer se realmente começarmos a pensar nos fatos reais, diários, de nossa vida. E, porque temos medo de examiná-los a sério, preferimos viver como cegos, sufocados, aflitos, desditosos, triviais”. O pensador nos diz que, quando sentimos medo, tentamos de alguma forma despertar em nós a coragem, mas não passa de uma “coragem imediatista”, que não destrói nem o medo nem aquilo que produz o medo, que é a memória do perigo. Então, a coragem imediatista se contrapõe ao medo imediatista, mas o medo voltará muitas vezes, de várias formas, ou melhor, nunca terá saído de lá – de lá de dentro de nós. Assim também os subterfúgios para se obter virtudes, como, por exemplo, a humildade ou a bondade, ou para fugir a qualquer punição. Diz ele: “Cultivar a humildade é simplesmente encobrir a vaidade, pois ela é uma virtude, e a virtude não pode ser cultivada”, e acrescenta: “Quando sois bom por temer punição ou desejar recompensa, há então um motivo; por conseguinte, isso não é bondade, porém medo”.

O ponto marcante nas palestras de Krishnamurti é sua insistência em nos fazer compreender a relação entre a mente e tempo – sobretudo o mecanismo do cérebro e todas as suas faculdades, o intelecto, a memória, a imaginação, em relação ao passado. É claro que precisamos da experiência, e experiência é o acúmulo da memória transformada em conhecimento evolutivo. Ou seja, é segundo o que já nos aconteceu e não nos matou que evitamos o mesmo risco; é com a experiência do prazer que buscamos repetir essa sensação agradável que alegra nossas vidas.  No entanto, assim como na questão do medo, também temos que de nos aperceber até que ponto a experiência é útil ou um empecilho. Ele nos exorta: “Encontremos uma maneira de viver nossa vida de cada dia livres da contaminação do passado – sendo “o passado” não só o tempo, mas também, tradição, experiência, conhecimento, memória”. Com isso ele nos quer dizer que, preocupados em demasia em evitar o desconhecido (que poderia ser útil e prazeroso) e apenas acatar o já conhecido (que a experiência, uma vez, nos mostrou prazeroso, ou pelo menos, sem dor ou sofrimento) deixamos de viver a plenitude do hoje e, quando nada dá certo, apostamos todas as nossas fichas, de novo, no amanhã. Mas, diz ele “O amanhã não é uma realidade porque é uma invenção do pensamento, destinada a dar-nos, psicologicamente, uma certeza de continuidade, assegura-nos o bem-estar. A realidade é o agora, presente viver. Mas não podeis viver agora se estais transportando a carga do passado”.

O pensador indiano advoga que “compreender é agir”. Não há intervalo (tempo) entre a compreensão e a ação, por isso, quando compreendemos, ou seja, quando alcançamos uma verdade, mudamos imediatamente – pois, do contrário, não seria “compreensão”. Precisamos, portanto, compreender que a casa está em chamas e que tudo está a ruir, e assim não há tempo para ficar fazendo comparações com algo do passado, da experiência, que está borbulhando na mente – é preciso agir, agora!

“O homem que sofre não pensa no amanhã ou na próxima vida; quer uma solução. E, se não achais tal solução, ficais vivendo de palavras, de crenças e dogmas, que se tornam vossos meios de fuga!”


Retomaremos o pensamento de Krishnamurti no próximo artigo. Até lá

segunda-feira, 18 de agosto de 2014

O MOVIMENTO ESTÁ NO AR

ENTREVISTA NO PROGRAMA "FALA COMUNIDADE"

Em comemoração ao Dia do Filósofo (16 de agosto), o nosso diretor/fundador foi convidado a dar uma entrevista para o programa da Rádio Ilha do Amor Fm, neste domingo (17/08).

Na oportunidade, foram tratados temas como democracia, cidadania e política, também falou-se do nascimento da Filosofia e de co mo ela passou de prática para teórica, ao longo dos séculos. Ele disse que Tales, Sócrates e Platão, assim como outros tantos filósofos dos primeiro séculos da Filosofia vivenciavam a sua filosofia. Durante toda a Idade Média, a Filosofia torna-se quase que exclusivamente teórica, e com a criação das primeiras Universidades, na Europa, ela vira de vez uma mera disciplina acadêmica.

O prof. Jaya deixou claro sua insatisfação com a obrigatoriedade do voto e as péssimas opções de candidatos que se apresentam para os vários cargos, nas Eleições. Além da falta de qualidade também dos eleitores, que reelegem até mesmo os políticos que nunca cumprem suas promessas e, pior, esquecem dos eleitores por um período de 4 anos, ou seja, até as próximas eleições.


Nosso diretor não deixou passar a oportunidade de apresentar alguns fundamentos da Terapia Hari e a função deste Movimento como divulgador da T.H.

A seguinte declaração do nosso fundador, pode muito bem resumir o teor da sua entrevista:
"A Filosofia não é um remédio que se guarda na gaveta para um dia, quando for preciso, usar. Filosofia é alimento diário - é essencial para a vida!"

TATEANDO NO ESCURO SOB AS LUZES DA ETERNIDADE

PALESTRAS NO CAP


Na quinta-feira (14/08), o Prof. Jaya esteve no CAP – Centro de Apoio Pedagógico ao Deficiente Visual do Maranhão “Anna Maria Patello Saldanha”, para ministrar palestras, pela manha e à tarde. O título escolhido, bem a propósito, foi “Tateando no Escuro sob as Luzes da Eternidade”. O tema principal, que perpassou toda a palestra foi “identidade e identificação”. Nosso diretor/fundador conduziu a temática de forma a apresentar o ponto de vista da T.H. e como o MOFICUSHINTH, através de seus cursos, artigos e palestras, trabalha por uma filosofia prática.


Logo de início, em sua Preleção, ele disse: “A experiência histórica nos faculta dizer que os eventos próximos podem até ser tratados à exaustão, porém, só são compreendidos devidamente quando analisados a certa distância. Por isso mesmo, penso que a temático que trataremos aqui hoje pode ser analisada de maneira bastante satisfatória, uma vez que carrega consigo questões que desde longo tempo preocupou a humanidade, como um todo.”



Depois, ele expôs num slide os conceitos de “identidade” e “identificação”, para em seguida complementar: “Embora o dicionário nos diga isso, creio que devemos fazer uma investigação um pouco mais profunda sobre esses dois termos, fora do contexto meramente semântico ou vocabular. Precisamos entender como entendemos “identidade e identificação” nos planos real, existencial e sensorial”, e discorreu sobre os três planos. Então, acrescentou: “cada um de nós tem um corpo, existe enquanto corpo, sente a Existência graças a esse corpo. Nós desfrutamos do prazer ou sofremos as dores nele e através dele, – nas dimensões corpórea, espiritual e mental. Porém, curiosamente, dá-se, ao longo da Existência, um fenômeno peculiar, porém estranho: esse corpo “muda” sua forma, seu aspecto, etc (na dimensão corpórea); muda seu estilo de vida, seus gostos, etc (na dimensão espiritual); muda seus pensamentos, suas idéias, seus ideais, etc (na dimensão mental). Então, o que sobra do “antigo eu”, da antiga identidade, se ela segue em constante mutação? Ainda mais curiosamente, com o advento da morte, aquele corpo está ali, praticamente como sempre foi, porém percebe-se que ele “já não é”. O que aconteceu? Qual a razão para que ele, embora ainda sendo ele, não seja mais?”.


O Prof. Jaya questionou não só o corpo como “identidade”, mas também o gênero, a idade e o nome. Ele perguntou à plateia: “Se o gênero e a idade também fazem parte da identidade de uma pessoa, por que alguém que nasceu no gênero masculino se sente do gênero feminino, ou alguém com 60 anos ou mais diz se sentir como se tivesse ainda vinte ou trinta e poucos anos?”, e, prosseguindo, disse: “Ao nascermos, recebemos um nome com o qual seremos identificados e pelo qual seremos chamados, primeiramente pelos familiares, depois por amigos, colegas de escola, colegas de trabalho, etc. Muitos de nós recebem também um apelido, o qual passa a se agregar à nossa personalidade: Carlos/Carlinhos; Eduardo/Edu; Jorge/Juca, etc. Artistas, celebridades, religiosos, políticos, escritores, etc  trocam de nome ou adotam pseudônimos que passam a ser mais fortes do que os próprios nomes de batismo. Até que ponto, então, o nome que recebemos ao nascer pode ser a nossa “identidade”?”.


Houve momento na palestra para se falar também sobre o que é o sucesso e a realização. A pergunta que o prof. Jaya lançou a todos foi: “Se sucesso e realização se traduzem na Existência basicamente em fama, dinheiro e poder, concluindo-se assim que quem obteve tudo isso vive ou viveu feliz, podemos dizer que Jesus Cristo teve sucesso ou se realizou em sua vida?”.

Perguntas como essa, que tratam do cerne de certas religiões, causa desconforto e polêmica entre a plateia e foi isso mesmo que se viu por lá. Os mais religiosos apressam-se em responder que “sim”, pois aquela era a sua missão – morrer pelos homens. No que o professor aproveitou para perguntar: “E nós? Nós temos alguma missão a cumprir no mundo?”. Algumas pessoas responderam que “sim” e cada uma tentou dizer qual seria a sua. Ao que o professor viu ali o apoio necessário ao que ele realmente queria perguntar: “Se recebemos uma missão ainda antes de nascermos, então isso não significaria que existíamos antes de nascer? E, portanto, nossa identidade original não se encontra exatamente no mundo, mas antes dele!”. Todos ficaram sem respostas, mas alguém resolveu devolver a pergunta ao nosso diretor, dizendo: “E para o senhor, qual é então a nossa identidade original?”. O prof. Jaya explicou que ele bem poderia acabar com a questão ali mesmo, dizendo que nossa identidade original é “Atman” (Alma Original), mas preferiu se fazer de “Sócrates”, e respondeu: “Não sei! Por favor, não faça perguntas a um filósofo – um filósofo é a pior pessoa a quem se pode perguntar alguma coisa. Ele é aquele que traz as problemáticas, os questionamentos; nunca, as respostas!”.


Mas no tópico seguinte, “Posição Original e Condição Existencial”, o prof. Jaya começou a delinear seu pensamento sobre nossa verdadeira identidade antes e depois da passagem por esta existência. Ele chegou a dizer: “se a religião pode nos apresentar a possibilidade de uma “existência post-mortem”, qual seria a nossa dificuldade em também considerar uma “vida antes da existência”? Essa vida anterior à existência poderia então ser a nossa “posição original”. E, sujeitados aos prazeres e mazelas da Existência, é que estaríamos experienciando a nossa “condição existencial”. Ou seja, esse “condicionamento” se efetiva enquanto estamos dentro do veículo chamado “corpo” – enquanto “condicionado”, corporificado”; e no tópico “Quem somos nós?”, o professor pergunta: “O que é o ser humano? Seria ele apenas o animal mais complexo, mais completo, mais inteligente, mais perfeito da Natureza? Seria ele, como propõe a Bíblia, a imagem e semelhança de Deus? Qual a nossa importância na trama universal?”.

No tópico “Eternidade X Imortalidade”, nosso fundador expôs seu pensamento sobre a reencarnação e explicou que o fato de sermos mortais não invalida a possibilidade de sermos eternos. Pois o que morre, diz ele, é aquilo com o que nos identificamos no mundo, enquanto o ser que somos na verdade segue de existência em existência.


Em outros tópicos, como “Livre Arbítrio X Determinismo”, “O que é a vida?”, “O que significaria morrer?”, o prof. Jaya vai encaminhando a audiência para os ensinamentos contidos na T.H., aí então ele chega ao tópico “Filosofia Teórica e Filosofia Prática”, mostrando que os primeiros filósofos (ou pensadores) vivenciavam sua filosofia, mas, ao longo do tempo, a Filosofia se tornou algo teórico, acadêmico. Então ele desenvolve o tópico “Qual o papel da Filosofia na vida?”, para só então, nos tópicos “O que é a Terapia Hari?” e “Por que Terapia e não Filosofia?”, ele realmente aportar no verdadeiro motivo de todas as suas palestras e artigos: a apresentação da Terapia Hari para um público já tocado pelos temas relevantes da vida, de tal forma que ela possa ser entendida e, por fim, aceita.


Bem, esta palestra pode ser levada a qualquer instituição, escola, faculdade, empresa, ou simplesmente apresentada para pessoas que realmente estejam dispostas a perscrutar as coisas valiosas e duradouras. Esperamos que muitos se interessem por ela e convidem o nosso diretor para levar para muito mais pessoas sua T.H. e este Movimento.

terça-feira, 29 de abril de 2014

A MAIOR REVOLUÇÃO HUMANA

A T.H. E O ESTUDO AVANÇADO DE FILOSOFIA


Há aproximadamente vinte sete séculos, iniciava-se um período de grande busca pelo conhecimento das coisas do mundo, da Natureza e da Existência. Como num passe de mágica a Terra deu cria a grandes homens, em algumas regiões, diríamos, privilegiadas do planeta, como a Grécia e a Índia, onde nasceram, por exemplo, Tales de Mileto (considerado o primeiro filósofo ocidental) e Siddharta Gautama (que se tornaria Buda, um dos maiores sábios da Oriente). Parecia que dali em diante era premente que o homem perscrutasse os grandes mistérios do mundo e decifrasse seus aparentes enigmas. Compreendeu-se, de repente, que era necessário indagar seriamente sobre o Universo à sua volta (composto pelos eventos naturais, os fenômenos captados por nossos cinco sentidos), tanto quanto uma espécie de “universo em seu interior” (onde se situam as emoções, os sentimentos, as vontades e as crenças inatas, que somente muitos séculos mais tarde, Karl Gustav Jung daria o nome de “inconsciente coletivo”). De lá para cá, essa busca frenética pelo conhecimento precisou ser sistematizada, dando origem às chamadas “Ciências” – as naturais (que pretendem dar conta dos fenômenos da Natureza), as exatas (dentre as quais a geometria, a aritmética e a matemática) e as denominadas de ocultas (que tratam dos fenômenos metafísicos, não apreendidos pelos nossos cinco sentidos).

            Essas ciências não param de dar crias e se renovam constantemente ao sabor dos novos conhecimentos adquiridos e da avassaladora tecnologia, que propiciou a criação de aparatos e dispositivos, como os telescópios e os satélites, que potencializam exponencialmente nossas capacidades físicas naturais, devido a seu alcance cada vez mais preciso e ao longe. Foi assim que os homens chegaram ao conhecimento de que a Terra se move, e esse movimento, diferentemente do que se imaginava, é ao redor do sol, e não deste em torno dela. Também, dessa forma é que foi possível concluir que o homem não é meramente um corpo, uma máquina de carne e ossos, mais um ser complexo, equipado, pelo menos, com três veículos, um físico e dois sutis, a saber: o corpo, a mente e o espírito, respectivamente. Daí, o que no começo não passavam de meras suspeitas, por exemplo, que havia outros planetas ou que ainda existia vida após a morte física, puderam encontrar sua comprovação científica.

           
Somente vinte e sete séculos mais tarde, surgiria um sistema filosófico adequado para a vida cotidiana, embora traga consigo um conhecimento avançado, que, apesar de não ser novo, é apresentado de maneira “novíssima”, chegando mesmo a ter que reavaliar certos conceitos, noções e valores, que são tidos como pontos capitais de muitas doutrinas religiosas, de certos sistemas filosóficos e de determinadas tradições, fazendo desse “novíssimo sistema” um desafio, tanto no tocante à sua compreensão quanto no que diz respeito à sua difusão.

             A proposta que a Terapia Hari (ou simplesmente T.H.) traz para aqueles que perceberam as incongruências daqueles conceitos, noções e valores mencionados linhas acima e as falhas ou inconclusões de muitos sistemas religiosos e filosóficos, é a aplicação diária de técnicas vivenciais, respaldadas por ensinamentos que, assimilados e reforçados a cada dia, darão frutos a médio e longo prazo. A T.H. não faz milagres, portanto, também não deve agradar aqueles que esperam resultados urgentes, imediatos. Ela não é uma terapia no sentido clínico ou médico; a cura que ela proporciona é a do “homem”, e não da “doença”. Na verdade, todas as enfermidades se encontram na razão direta desse “desconhecimento de si mesmo” – do homem integral, ou do ser original que é. Esse desconhecimento é “a mãe de todas enfermidades”, de todas as dores e sofrimentos humanos. No entanto, a T.H. não deve ser entendida como uma panaceia, pois ela, ainda que praticada por todos os homens (o que não passa de uma utopia insana), não tem o poder de erradicar a dor e o sofrimento do mundo. Isso porque, como é explicado alhures, a Existência não é a “instância dos absolutos” – ela se estabelece necessariamente sobre pares de opostos (luz/sombra; prazer/dor; vida/morte, etc), sendo, portanto, impossível pretender-se a erradicação de um dos componentes destes pares.

O Estudo Avançado de Filosofia é a porta de entrada para uma terapia do homem integral, a T.H., e somente através da apreensão dos conhecimentos ali ensinados e praticados se obterá “a cura” – sem milagres, sem saltos, sem charlatanismo. O remédio da T.H. tem doses diárias, ininterruptamente. O sucesso não pode ser avaliado segundo resultados facilmente conquistados. Por exemplo: o trabalho iniciado com uma pessoa que se encontra num nível existencial altamente debilitado, seja em seu aspecto físico, moral, mental ou espiritual, provavelmente não dará resultado positivo nesta encarnação. E jamais haverá garantias de quantas encarnações serão necessárias para um efetivo resultado. Sendo, como se vê, de suma importância que o praticante da T.H. compreenda que o trabalho empreendido é árduo e demanda (muito) tempo, e que, portanto, entender  a ciência da reencarnação, compreender o mecanismo cármico existencial e ser determinado em seu tratamento são condição sine qua non para o sucesso em tempo propício.




            Deve entender-se, portanto, que não há qualquer possibilidade de se praticar a T.H., caso não haja previamente uma mudança radical de certos valores, conceitos e noções arraigados na mente. As crenças religiosas e as superstições (que são quase sinônimos) são mais empecilhos do que ferramentas úteis à terapia. Não sentenciamos, como o fez Nietzsche, que “Deus está morto”, mas precisamos, nós da T.H. e os pacientes dela, chegar à conclusão harmoniosa de que “Deus não passa de uma ideia” – às vezes, benfazeja, outras vezes, terrivelmente perniciosa. Aquele “Deus perfeito”, aquele “Deus bondoso” e todos os seus anjos e santos devem ir para o porão do nosso imaginário, tanto quanto o Diabo com suas legiões de demônios e espíritos-de-porcos. Deuses e demônios, senhores do bem e do mal, entidades superiores invisíveis, criadas nos primórdios de toda a eternidade, para ajudar ou corromper o homem, são ideias tão fantasiosas que parecem personagens do imaginário infantil. Nada disso é útil quando se busca resultados verdadeiros na totalidade da Vida. Pobre daqueles que temem a morte por julgar que podem ser atirados no Inferno! Triste daqueles que a ambicionam, abdicando de ter uma existência plena, somente porque “acham” que irão para o Céu! São, como dizem por aí, “almas desperdiçadas” ou, pelo menos, “desencaminhadas”. Enterraram seus talentos e esperam ainda que sejam atendidos (não se sabe por quem) em suas preces.

            A T.H. tem a pretensão de trazer o arcabouço do conhecimento humano em gotas homeopáticas. Para tanto, porém, teve que fazer uma depuração em todo esse conhecimento, pois, ao longo da Existência, apreende-se o que é verdadeiro e o que é falso, o que é útil e o que é desnecessário. O Estudo Avançado de Filosofia, como proposto na T.H., leva em consideração sábios e filósofos, homens aparentemente comuns, simples, e Avatares. Nada pode ser desperdiçado; nenhuma lição pode ser perdida; nenhuma gota desse remédio amargo, porém eficaz, pode ser derramada. Nossa sala de aula é a Vida; nossa enfermaria é a Existência.  

terça-feira, 22 de abril de 2014

A EXPERIÊNCIA DA T.H.



Capítulo I

A SEMENTE



- Meu filho, o que você faz aí, deitado nessa cama? Vá brincar com os seus coleguinhas!,  foi assim que minha mãe me despertou do meu "sono acordado".

Por volta dos meus dez anos de idade, era muito comum eu me isolar, para viajar num mundo só meu, que ninguém mais via. Por lá, eu via coisas que neste mundo aqui não havia; lá, eu aprendia muito mais do que por aqui. Foi num momento assim que minha mãe me apanhou deitado em sua cama, geralmente com as pernas pendendo para fora dela. Era meu jeito de “sonhar” ali. Minha mãe não conseguia entender aquilo: como é que eu não estava brincando, como os outros garotos da minha idade? Eu também não sabia por quê.

Anos mais tarde, descobri que provavelmente havia muitas outras crianças que “perdiam o olhar dentro do nada”, como se buscassem um mundo onde todas as respostas podiam ser encontradas. Como pude ver nesse depoimento de Fred Alan Wolf (físico americano especializado em Física Quântica), no livro “Quem somos nós?”:

“A pergunta realmente é: o que Deus está fazendo para construir um universo? [...] Meu interesse sempre foi pela magia como uma forma de abordar o que eu pensava ser uma coisa muito miraculosa. Basicamente, por que estamos aqui? O que está acontecendo? Mesmo quando criança eu fazia essas perguntas.”

Eu era muito taciturno em casa, mas na escola, eu era muito divertido. Gostava de estudar, gostava do ambiente escolar, dos colegas, dos professores. Fui assim por um bom tempo, até que algo aconteceu.
Naquele dia, o primeiro horário era de matemática, com o professor Mesquita. Eu, como sempre, sentado em uma das carteiras da frente da sala, para não perder nada da aula. Mas já se haviam passado quase 30 minutos e eu não dera “um pio”, nenhuma palavra, nenhum gracejo. O professor Mesquita estranhou.

- O que é que está havendo? Você está tão quieto, não falou nada até agora!, observou o professor.

- Nada, não! – respondi evasivo, mas ele insistiu:

- Nada, não, você não é assim. O que foi que aconteceu?

- Minha mãe morreu!, disparei apenas sério, sem esboçar qualquer expressão de dor ou tristeza.

A turma toda entrou em comoção, embora alguns ainda esperassem que tudo não passasse apenas de mais uma das minhas brincadeiras. O professor quebrou o silêncio e perguntou com ar de aborrecimento.
- Você está brincando? Não brinque com essas coisas!, sentenciou.

- Não estou brincando, Ela morreu mesmo!

Isso foi suficiente para a aula terminar. O professor Mesquita foi até a diretoria comunicar o fato. A diretora veio de lá, não para me dar os pêsames ou coisa assim – ela veio para me dar um “carão”.
- Como é que sua mãe falece e você não comunica a escola e ainda vem para a sala de aula?, detonou.
- Eu não sabia que tinha que comunicar. Desculpe!, falei com sinceridade.

- Vá para sua casa imediatamente!, disse a diretora para mim, e voltando-se para a turma, concluiu: Não haverá mais aulas hoje, podem ir para casa. A mãe do colega de vocês faleceu!

Eu voltei para casa, onde todos estavam tristes pela morte de mamãe. Eu também estava, mas, estranhamente, eu não aparentava nada; fiquei apenas sentado no muro lá de fora. Até que um amigo, vizinho nosso, se aproximou para dar os pêsames. Então, me vieram as primeiras lágrimas, e quase não pararam mais.

Naquela época, eu tinha apenas 17 anos e o mundo ficou grande e vazio demais. Achei que aquele dia jamais ia acabar. Identifiquei eternidade e tristeza como sendo a mesma coisa – um sem-fim de tudo, de tudo o que não fazia mais sentido. Mas isso só durou algum tempo. A vida sempre acha um jeito de nos cativar outra vez. E ela também achou comigo.

No entanto, nada mais foi como era antes. Eu já não estava mais disposto a apenas aceitar o que me diziam, não importava qual fosse a autoridade. Eu não aceitava mais as respostas prontas, as explicações que nada explicavam. Eu, dali em diante, faria as minhas próprias perguntas e iria atrás das respostas que realmente me convencessem, que fossem plausíveis e não mero jogo de palavras. Acho que a semente de tudo isso – de tudo que relatar aqui – brotou naquele momento, em minha vida. Dali em diante, eu criaria a minha própria “filosofia” – eu desenvolvi a minha “terapia do viver”.